O meu sábado começou como muitos outros sábados já haviam começado, na Doca do Espanhol junto ao ponto de entrada da Caravela Vera Cruz. Cheguei e apresentei-me: "Sou a Joana, amiga da Mariana". Apresentações feitas, veleiro e skipper atribuídos - "Vais com o Bruno no Steve Mcqueen". O trabalho é fácil - cortar comida, servir comida, servir bebida, levantar a mesa e lavar a loiça e, no fim, navegar. Sentar-me na popa do veleiro no rio Tejo e deixar-me ir, vento na cara, sol nas costas e ser feliz. Acho que não via as coisas tão assim há um ano atrás. No final do trabalho fui a pé até ao Cais. Decidi que ía deixar o Gusto ao aeroporto já que não o vamos ver durante muitos meses e depois acabei por ir passear com a Bea pela Baixa e ir jantar com ela. Ela diz que tinha saudades da Baixa, eu também. Depois de ter estado em Macau chego à conclusão de que não existe nada tão bonito como a Baixa Pombalina. Não existe mesmo. O espaçamento largo das ruas, o rio no fundo das mesmas, sendo em si o seu desígnio. Aquela cor azul que não existe noutro lado, não para mim. E o fim de tarde crepuscular em tons rosados, com a brisa que me levanta os fios de cabelo da franja e os sons agradáveis e cruzados de buzinas, carros e pequenas performances de rua que os artistas costumam expressar na rua para atraír turistas e, consigo, gorjetas. Vou sentir falta desta minha cidade, vou sentir falta se não sentir nunca lhe darei valor, nunca terei o padecimento da liberdade.
Ao chegar a casa dei comigo a ouvir músicas que não ouvia há muito tempo e apreciar de novo os seus tons, como se não as tivesse ouvido uma única vez na vida.
Lembro-me muitas vezes de coisas que me diziam, não que elas me incomodem, não incomodam, mas percebo a razão de mo terem dito. Eu pertenço a ninguém e pertenço a toda a gente - eu deixo toda a gente entrar e não deixo ninguém, dou o meu sorriso a todos os estranhos e guardo-o só para mim no seu significado - nem o João conseguiu alguma vez entrar sozinho no meu espaço, eu precisava que outrass pessoas estivessem presentes também para estar feliz. Eu não tenho nada e quero tudo. Sinto o fogo, a intensidade em todas as experiências, apaixono-me por tudo desenfreadamente, tenho uma obsessão pela liberdade, que ninguém me toca nem tocará nunca, essa liberdade que me assusta ao ponto de me calar e me puxar para uma vida nómada de loucura que me deslumbra e me deixa tonta. Sou eu. E de repente entendo-me.
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